Terminou neste domingo a Série C do Campeonato Carioca, a quinta divisão profissional do Rio de Janeiro. Foi uma competição de momentos importantes, como o título do estreante Zinzane e o acesso do tradicional São Cristóvão. Mas houve também momentos negativos: o número de WOs bateu recorde (35) e as suspeitas de manipulação de resultados mancharam um campeonato já combalido por uma série de dificuldades financeiras, midiáticas e até de credibilidade.
Goleadas inexplicáveis, escalações trocadas em cima da hora e até ‘jogadores-fantasma’ foram só alguns dos elementos que acabaram marcando esta edição da Quintona. E o maior temor é que elas passem em branco. Afinal, apesar das denúncias feitas por jogadores e das evidências de possíveis fraudes, não parece haver, por parte das autoridades, um desejo concreto de resolver o problema.
É verdade que três clubes chegaram a ser suspensos (Duque Caxiense, São José e Brasileirinho), mas esta punição acabou sendo ‘para inglês ver’, já que as equipes só entrariam em campo mais uma vez na competição, no momento em que foram sancionadas. Além do mais, os jogadores dessas equipes é que acabaram castigados por não poder entrar em campo, também por conta de uma medida do Tribunal para investigar os reais problemas.
Com o fim do campeonato e a possível perda de atenção sobre estes eventos, aumenta ainda mais a possibilidade do Tribunal de Justiça Desportiva (TJD-RJ) não se movimentar como poderia para tentar resolver a situação. Até o momento, a Procuradoria não parece ter conseguido evoluir no sentido de trazer novidades dentro do caso. Dessa forma, todas as denúncias e evidências colhidas ao longo dos últimos meses podem acabar em pizza.
O que, aliás, não seria nenhuma novidade. Apesar do escândalo divulgado em 2019, envolvendo clubes como Atlético Carioca e São José, estas suspeitas são bastante comuns dentro da competição. E nada (ou muito pouco) é feito. Dirigentes com intenções duvidosas, gestores interessados unicamente em lucrar e jogadores em vulnerabilidade financeira e social formam, juntos, o sistema para as manipulações. No fim, nada é provado, desculpas como as de sempre são dadas e a roda continua girando.
Anos atrás, o presidente Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ), Rubens Lopes, justificou o aumento na taxa de filiação para um clube profissional no Rio de Janeiro (que passou a ser de R$ 500 mil), afirmando que a medida serviria para afastar eventuais ‘aventureiros’. No entanto, essa prática parece não ter surtido grande efeito, já que empresários ligados ao ramo de apostas não precisam pegar um clube do zero. Utilizam-se de clubes já com CNPJ ativo na Federação e prometem bancar mundos e fundos para disputar a competição. O que acaba saindo bem mais barato do que gastar meio milhão só para entrar em campo, fora outras despesas. E se mostra, ainda que por motivos escusos, ser um negócio bastante lucrativo.
O ACESSO CARIOCA não é advogado, mas ao contrário de outros que se aventuram (ou já se aventuraram) na mídia esportiva carioca, tem lado. E este lado é o dos jogadores, dos atletas, dos profissionais que trabalham a sério, da esportividade e daqueles que consideram que futebol não deve ser um teatro, nem um negócio. Qualquer postura diferente disso seria tornar-se ‘chapa branca’, como se diz dentro da gíria do jornalismo. E este é um caminho que, entendemos, não deve ser seguido. Pelo bem verdadeiro do futebol carioca e do jogo em si.
Evidentemente, na Quintona, também existe espaço para talento. Prova disso é que o Campos conseguiu negociar seu lateral-esquerdo titular, de apenas 16 anos, para o Botafogo. Entre outros jogadores que se destacaram ao longo da competição e que seguirão empregados, dentro ou fora do Rio, ao longo do ano de 2023. Por outro lado, não se pode tapar o sol com a peneira. É preciso, em primeiro lugar, ter humildade para entender que ainda há muito a ser feito para tentar coibir manipulações na Série C e em outras divisões do Campeonato Carioca.
Certamente, ficaremos com as imagens positivas desta competição, como a reabertura da Figueira de Melo, os golaços de Denilson e Castro pelo Zinzane, o surpreendente CAAC Brasil e o clima pacato, mas apaixonante de estádios como a Teixeira de Castro e o Joaquim Flores em um domingo pela manhã. Mas uma competição já tão abatida como a Quintona merece um cuidado maior. Pelo futebol carioca e brasileiro, pelos esforços feitos por profissionais todos os dias, pelos princípios que nos indignam a todos, a cada denúncia e suspeita que vemos, das maiores às menores divisões. É de uma reciclagem moral e ética, em primeiro lugar, que o futebol carioca precisa.
Belo editorial. É isso mesmo.