Para muita gente, parece impossível acreditar que o modesto São Cristóvão, aniversariante desta quinta-feira (12), já foi capaz de ter alcance internacional. Mas a verdade é que os cadetes já brilharam em gramados que vão muito além do Rio de Janeiro. Vitórias em territórios estrangeiros, representantes na Seleção Brasileira e um sem número de jogadores revelados em Figueira de Melo. Tudo isto prova o talento cristovense em mostrar, também fora do país, que o futebol praticado por lá sempre teve seu valor.
Na primeira metade do Século XX, o calendário não era tão cheio como atualmente. O Campeonato Carioca, grande vedete, só durava cinco meses e era preciso manter o time ativo durante o restante da temporada. Tudo para atender a demanda de um público apaixonado por futebol e que ajudava a manter as contas em dia. Dessa forma, sem campeonatos nacionais em disputa, as excursões pelo Brasil e pelo exterior eram comuns. E o São Cristóvão foi um dos pioneiros neste sentido.
O clube viajou por diversas partes do mundo: em 1937, foi ao Egito e tornou-se o primeiro time brasileiro a atuar lá. Ademais, passou ainda por países como Turquia, Grécia, Bolívia, entre outros. O ‘boom’ destas excursões aconteceu nos anos 1950, quando o futebol brasileiro já gozava de grande prestígio. Ao São Cristóvão, certamente a melhor lembrança é de uma ida histórica à Europa e ao Mediterrâneo, onde conseguiu grandes vitórias.
Em 10 de abril de 1954, a delegação partiu do Aeroporto do Galeão. Ao lado do técnico Osvaldo Costa, viajaram Hélio, Manfredo, Ivan II, José Alves, Severino, Décio, Milton, Sarcinelli, Cabo Frio, Ivan, Carlinhos, Herrera, Cosme, Índio, Kibon, Franklin, Arlindo e Jorge. O time visitaria oito países: Itália, França, Malta, Dinamarca, Alemanha, Argélia, Marrocos e Tunísia. E a estreia seria contra a poderosa Roma, no Estádio Olímpico. Mas os dirigentes cadetes erraram ao comprar as passagens e colocaram o time em um avião rumo a Lisboa.
Os atletas pernoitaram em Portugal e o jogo quase não aconteceu. Mas o problema acabou resolvido e o São Cristóvão viajou de madrugada. O time chegou a Roma na manhã do dia 14 e teriam de atuar à tarde. Cerca de 15 mil pessoas foram ao Olímpico, mesmo com o time da casa atuando com alguns reservas, já que teriam clássico contra a Lazio, quatro dias depois. A Roma fez 1 a 0 com gol de Andreoli, mas os cristovenses empataram com Ivan e viraram, no segundo tempo, em um gol de Arlindo: 2 a 1, vitória histórica do São Cri-Cri, na capital italiana.
A empolgação fez o São Cristóvão virar sensação e a Lazio quis enfrentar os cadetes. Mas não foi possível porque o clube já estava acertado para seguir sua turnê no Norte da África. Lá, teve belas atuações e conseguiu vitórias expressivas. A maior delas foi um 11 a 0 em cima do Espérance, da Tunísia, a maior goleada de um time brasileiro sobre um europeu como visitante até então. Na época, a Tunísia não era independente: ainda pertencia à França.
Posteriormente, o São Cristóvão foi a França: ganhou do Red Star e empatou com o Lyon, indo em seguida para Malta, onde manteve a invencibilidade e ganhou até da seleção do país. De volta à França, derrotou o forte Saint-Étienne por 2 a 1, antes de ir para a Dinamarca, ganhando dois jogos e empatando um. Só perdeu a invencibilidade na Alemanha, já no fim da excursão, perdendo para o Kassel. Ao todo, foram 20 jogos, ganhando dez, empatando oito e perdendo apenas dois.
Na Seleção, baianos e Athletico (PR) ficam para trás
Mas o potencial do São Cristóvão de ir além-fronteiras não se restringe a jogos com a camisa do clube. A Seleção Brasileira também já foi importante vitrine para jogadores, chamados enquanto defendiam o time da Figueirinha. Até hoje, os cadetes têm um posto do qual podem se orgulhar: é o 24º time que mais cedeu jogadores à Seleção. Mais do que Sport (PE), Vitória (BA), Bahia e Athletico (PR), equipes tradicionais, mas que chegaram depois na fila de representantes na Amarelinha.
No Rio, o São Cristóvão é superado pelos quatro grandes, além de America e Bangu, em número de atletas cedidos ao time canarinho. Mas, em Copas do Mundo, o clube tem ares de pioneiro. No Mundial de 1930, o primeiro da História, Theóphilo e Zé Luiz, campeões cariocas em 1926, estavam no Uruguai. Cada um deles esteve em campo em um dos jogos: Theóphilo, na derrota contra a Iugoslávia; Zé Luiz, na vitória sobre a Bolívia.
A Copa de 1938, na França, foi uma verdadeira consagração, com Affonsinho e Roberto titulares. O primeiro jogou quatro vezes e o segundo esteve em campo em duas oportunidades. Foi de Roberto – um dos maiores artilheiros da cristovenses, aliás – o gol da vitória em cima da Tchecoslováquia, nas quartas de final. Mais tarde, o Brasil terminaria a Copa do Mundo em terceiro lugar.
É verdade que já faz tempo a última atuação de um cristovense pela Seleção. Em 10 de março de 1963, Altamiro esteve em campo na vitória sobre o Peru, pela Copa América. No entanto, os 11 cadetes da Seleção principal estão na História. Na base, nomes como Humberto Tozzi, Franz, Ari, Renato Isidoro e Ivo Soares também foram lembrados. Isto sem falar em Ronaldo, que disputou várias partidas com a Seleção Brasileira Sub-17, entre 1992 e 1993, ainda como cristovense, antes de se transferir para o Cruzeiro (MG).
Jogadores que defenderam a Seleção enquanto atuavam pelo São Cristóvão:
(entre parênteses, o ano da primeira partida)
14 jogos: Affonsinho (1935)
9 jogos: Nesi (1922)
8 jogos: Roberto (1936)
6 jogos: Theóphilo (1929)
4 jogos: Martins (1919)
3 jogos: Zé Luiz (1930), Agrícola (1932) e Carreiro (1939)
1 jogo: Doca (1930), Francisco (1935) e Altamiro (1963)
Muito show, saber da história dos cadetes, orgulho desse time que já fez história e breve estará entre os grandes só Brasil!